quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Caminhante


Os Sapatos- Van Gogh

Tudo muda
Perpasso mesas de bares com olhar sorrateiro:
Alguns jogam vídeo game
Outros cerveja ás 10 da manhã
No âmago um enjôo sem cura
Nós e os outros
Outros sem nada de nós
Acúmulo de casos
Acasos
Ternos descasos
Simultâneas filas que andam
Atrás de um caso outro caso
E quando caso?
Até então sei só quando descaso.
Cada segundo possui um ponto final
Tudo muda

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Freud para além da alma




Há muito tempo me considero Junguiana. Amo minha terapeuta Junguiana e tenho paixào pelo mistério que é o inconsciente. Este filme mostra claramente que Freud contribuiu muito para o estudo do inconsciente. Ele transforma o curso da história de seu tempo. Bom filme.
"Baseado no roteiro escrito pelo filósofo Jean-Paul Sartre, com uma linguagem metafórica e onírica, o filme pretende mostrar a teoria freudiana do inconsciente. Através do conflito interior que viveu Freud enquanto tentava penetrar o obscuro “inconsciente” de seus pacientes, pois temia encontrar o inefável, o impensável (na verdade, Freud temia encontrar a sua própria essência…). Freud Além da alma é um filme acadêmico, inteligente e instigante, que nos permite uma melhor compreensão das teorias freudianas sobre o funcionamento da mente e como o pensamento psicanalítico irrompeu na sociedade vienense e depois no mundo."

No site http://www.cafefilosofico.wordpress.com/ é possível baixar o filme todo. Vale a pena ver o filme e visitar o site também .

domingo, 27 de dezembro de 2009

Viver – filme de Akira Kurosawa



Viver – filme de Akira Kurosawa


Título original:Ikiru
Título em Português:Viver
Realizado por: Akira Kurosawa
Atores: Takashi Shimura, Shinichi Himori, Miki Odagiri
Data:1952
País de Origem: Japão
Duração:143 min.
Preto e Branco, Som


Acabei de assistir esta obra prima. Tem filmes que são imperdíveis. Este é um deles. "Viver" mostra o valor de viver que um homem só percebe ao saber que vai morrer. O que realmente importa em nosso cotidiano? O que abrange a ação de viver?
No caso desse filme o protagonista é chefe em uma prepatição do serviço público. Quando ele descobre que vai morrer passa a viver. Incrível!
O filme é extraordinariamente dividido entre dois períodos: a mudança na vida do protagonista após descobrir que teria no máximo 6 meses de vida e o velório dele mostrando as transformações que suas ações geraram e mecanizações burocráticas ( burrocracia) dos que viviam ao seu lado.
Como um homem muda tanto em 6 meses? O que teria provocado tal mudança? O primeiro comentário sugere que só poderia ser mulher. Depois de muita discussão chegam ao consenso de que ele sabia que estava com câncer e por isso havia mudado tanto. Todos riem e dizem: “ Assim até eu!” Subitamente um dos participantes do velório se levanta e fala: “E se a gente morrer de repente?” Silêncio. Logo chega o cometário: “Vocês nunca fariam o que esse homem fez!” Silêncio.
E o que fez esse homem nos seis meses que lhe restavam? Viveu. Foi generoso, ajudou os moradores do bairro a terem um parque para as crianças, deixou dinheiro para o filho, transformou sua realidade. E claro também foi jogar fliperama e encher a cara. Sorriu muito. Insistiu em quebrar a burrocracia. Foi ameaçado pelos donos do poder. Mas que importava? O homem não tinha medo de morrer.
No meio do filme tive que atender a campainha. Era um morador de rua me dizendo: “Tô com fome dona, me dá alguma coisa pra eu comer agora? Tô morto de fome.”
Esquentei o macarrão, que certamente iria para o lixo, e dei a comida requentada para o homem. Desaguei um mar salgado e límpido pela desigualdade social. O capitalismo des-ensinou o ser humano a viver.
Cumprimos papéis sociais extremamente egoístas. Vemos pouco mais que nosso umbigo. "Quantos sonhos mesquinhos", pensei, ao ver a fome do homem na minha porta.
Tem o outro. Tem o mundo. E existe um real caos. Como ser artista, médico, engenheiro, político, empresário, lixeiro sem se dar conta dessa realidade?
Até quando esses ridículos habitantes do planeta terra não vão dar valor ao meio ambiente, a humanizaçào, a vida? Uma burrocracia come quase toda a comida existente no mundo. Vejo fome, opressão, devastasão, desigualdade. Avisto o caos e não há como me eximir dessa realidade cruel que o ser humano moderno está engolfado. Muito trabalho a fazer relacionado a humanização do ser humano. Espero que não haja necessidade de estarmos prestes a morrer para começarmos querer viver.
O mundo está pegando fogo e o inferno é aqui. Momento de profundas transformações.
Viver- Ikiru, vale a pena.

Vejam uma bela resenha de Miguel Patrício sobre esse filme:

“Existem filmes inesqueciveis marcados pelo toque no coração, pela humanização pedagógica e pela intemporalidade tanto nos temas, como nas emoções que nos fornecem. Ikiru é, na minha opinião, o filme que representa tudo isso melhor. É um dos filmes mais belos e perfeitos de Kurosawa e do mundo. Encerra em si toda a condição humana metendo-a na boca de um velho doente de câncer com apenas seis meses de vida que irá descobrir nesse pouco tempo o significado de"viver". Takashi Shimura é fenomenal, sidera pela sua prestação - na minha opinião a mais completa e terna que já presenciei -, deixa-nos de boca aberta perante o sofrimento psicológico que vive, pela saudade do tempo que passou e das vivências que terá de deixar para trás, quando partir defenitivamente. Ikiru inicia-se com um raio-x do estômago de Kanji Watanabe, um velho chefe de secção das obras públicas, ao qual o narrador insurge dizendo que Kanji sofre de um câncer do estômago, mas ainda não o sabe. Ao mesmo tempo, ouvem-se vozes - tal como um coro grego - de queixumes de senhoras pedindo a construção de um parque infantil numa zona cheia de lama e lixo. Kanji é apático, oco, vazio, vive numa anestesia e surdez total procurando trabalhar viciadamente - como quase toda a população japonesa. Assim, as senhoras procurando resolver a situação destinada às obras públicas entram numa rede enorme burocrática atrasada e desorganizada levando à desistência de todo o esforço feito para a proposta de uma idéia. No escritório de Kanji ouve-se também uma piada lida por Toyo, uma empregada sua. Dizia ela rindo como uma criança:"Nunca tiraste um dia de folga?", "Não." "Porquê? És indespensável no teu trabalho?", "Não, Eu não quero que eles descobram o que conseguem fazer sem mim." Kanji não percebe (ou nem ouve) e volta ao seu usual trabalho monótono de assinar papéis sem os ler e arquivar projectos esquecidos na gaveta poeirenta.Eis que Kanji se informa do seu estado de saúde - note-se a cena do doente contando a Kanji os truques e mentiras dos médicos para não assustarem os pacientes que pouco tempo podem viver. A cena do apercebimento do reduzido tempo restante de vida da personagem principal, logo no ínicio, é só por ela tocante e assustadoramente constrangedora. Watanabe começa-se a tornar num vagabundo, num velho transeunte solitário com o seu pesado fardo: saber quanto tempo lhe resta para viver. A falta de comunicação com o seu filho - por culpa do pai(?) - torna a compaixão pela personagem principal cada vez mais fácil e existente. Kanji ouve sem querer uma conversa do filho e da esposa em que esta comenta que com a pensão da morte do velho pai, poderiam construír uma nova casa. A frieza do filho - que numa remeniscência de Watanabe, não queria deixar o carro fúnebre que levava a sua mãe - é a demonstração de um homem dos negócios e do dinheiro. Frio, como era o pai, vendo as emoções e as pessoas como se fossem números, é óbvio que quando o pai lhe quer contar o que tem, ele fecha a porta do seu quarto e pede para este trancar a porta principal.Por cima das honrarias do seu trabalho e da alienação consequente do dinheiro e das economias, é sozinho que Kanji chora descontroladamente por debaixo da cama o desconcerto com o mundo e com o seu passado mumificado.O coração do nosso velhinho dilacera-se entre a auto-destruição e o questionamento da sua felicidade. Ele primeiro, desesperado, leva as suas economias e gasta-as de forma hedonista em saké, em mulheres, em clubs nocturnos - e note-se como estes são o lugar das massas, estando filmados de forma furiosa e abarrotada como uma prisão -, acompanhado pelo companheiro vestido de negro, o novelista mefistofélico. Já no Fausto de Goethe, o diabo comprava a alma do doutor idoso; em Ikiru, Kanji vende a sua alma pelo deleite e pelo prazer descabido, desastrado e suícida. No final das sequências magnificamente filmadas da boémia nocturna, é o ar enjoado e as lágrimas desesperadas do principal, entrecruzando com as cantigas melancólicas das mulheres da vida, que nos fornecem a segurança que todos aqueles ambientes americanizados - diga-se - são pouco saudáveis, e refiro-me, pois, a essa metáfora que é estar-se doente. Depois de experenciada a descida aos infernos da vulgaridade corrupta da cidade negra, Kanji procura, como um cego, tacteando pelos passeios por entre as crianças o significado de viver. Aí cruza-se com a sua empregada Toyo, a mesma que lera a piada no princípio, cujo significado é uma das várias mensagens do filme. Toyo é a criança, a doce rapariga brincalhona, tímida e cristalina que desperta em Kanji o desejo de a fazer feliz. Conquista-se um pouco de felicidade, nestas cenas tão amáveis e que surgem após a tempestade. A cena do café, uma das mais profundas e maduras da história do cinema, é desenrolada pela descoberta da felicidade. Kanji grita e desce as escadas da vida, enquanto na mesa ao lado se cantam os parabéns. Descobre-se que a nossa felicidade reside no facto de fazermos felizes os outros.Só, mas determinado, surge um novo homem para além do medo de morrer. Watanabe volta ao trabalho e luta contra a burocracia do sistema do pós-guerra (e actual?), escrevendo um testamento pela sua nova obra - o parque de crianças pedido no princípio.E, de um momento para o outro, somos informados da morte de Kanji pelo narrador. Situamo-nos no seu funeral, e as opiniões dos presentes surgem num espectáculo de remeniscências a qual é finalizada por um polícia que conta a sua verdadeira morte - desmascarando assim as histórias circuladas pelos seus patrões. Por entre o branco da tempestade de neve e os corredores de ferro, sobrevêm poesia visual quando se observa Kanji, sorrindo e chorando, cantando roucamente os seguintes versos:

A vida é breve.
Apaixona-te,doce senhora,
Enquanto os teus lábios ainda estão vermelhos,
E antes que tenhas frio.
Porque não existe nenhum amanhã...


Ninguém saí desta cena indiferente: a montagem, o trabalho de câmara, a representação e a música, todos eles (inter)agem no espectador como uma explosão metafórica desta vez da morte do amável senhor Watanabe. A homenagem ao grande homem é glorificada pelo parque onde as crianças são felizes e podem brincar - pois tal como em Yume ou em Hachi-gatsu no kyôshikyoku - a perda da infantilidade, da paz e do sorriso conduzem à alienação, à escolha do fácil e do imediato, da economia e da guerra, logo na destruição do que é humano."

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Dickens


Charles Dickens,
Viveu e foi um dos maiores escritores que já passaram pela terra. Morreu de morte cerebral em junho de 1870. Foi sepultado no Poet’s Corner ("Esquina dos Poetas"), na Abadia de Westminster. Na sua sepultura está gravado: "Apoiante dos pobres, dos que sofrem e dos oprimidos; e com a sua morte, um dos maiores escritores de Inglaterra desaparecia para o mundo."

Maravilhoso parágrafo de uma senteça e várias vírgulas:

"It was the best of the times, it was the worst of the times, it was the age of foolishness, it was the epoch of belief, it was the epoch of incredulity, it was the season of light, it was the season of darkness, it was the spring of hope, it was the winter of despair, we had everything before us, we had nothing before us, we were all going direct to Heaven, we were going all direct the other way- in short, the period was so far like the present period, that some of its noisiest authorities insisted on its being received, for good or for evil, in the superlative degree of comparison only. "
The tale of two cities - Charles Dickens

Veja outro parágrafo do mesmo livro de Dickens, agora em português:

“Um fato extraordinário a merecer reflexão é o de que de cada ser humano se constitui num profundo e indecifrável enigma para todos os demais.
Sempre que entro numa grande cidade à noite, considero com solene gravidade que todas aquelas casas fechadas e escuras encerram seu próprio segredo, que cada aposento em cada uma delas oculta um mistério, que cada coração pulsando nesas centenas de milhares de peitos esconde algum segredo para o coração que está a seu lado! Alguma coisa do horror, até mesmo da Morte, tem a ver com esse fato.
Não mais posso virar as folhas daquele querido livro que amei e em vão pretendi ler.
Não mais posso contemplar as profundezas dessas águas insondáveis nas quais, à luz fugaz dos relâmpagos, vislumbrava tesouros enterrados e outras preciosidades submersas.
Estava escrito que o livro deveria fechar-se para todo o sempre, quando eu lera apenas uma página. Estava escrito que as águas se imobilizariam sob um gelo eterno, enquanto a luz brincava em sua superfície e eu me detinha, ignorante, às suas margens.
Meu amigo está morto, meu vizinho está morto, meu amor, a eleita de minha alma, está morta; e essa é a inexorável consolidação e perpetuação do segredo que sempre existiu nessa individualiadde, e que eu próprio também carregarei comigo até o fim da minha vida. Dormirá, nos cemitérios desta cidade por onde agora passo, alguém mais inescrutável do que é para mim qualquer de seus habitantes vivos e ativos, ou do que sou eu próprio para eles?”
“Um Conto de Duas Cidades”, de Charles Dickens

Romances principais

The Pickwick Papers (1836)
Oliver Twist (18371839)
Nicholas Nickleby (18381839)
The Old Curiosity Shop ("Loja de Antiguidades")(18401841)
Barnaby Rudge (1841)
A Christmas Carol ("Canção de Natal" ou "Um canto de Natal") (1843)
The Chimes (1844)
The Cricket on the Hearth (1845)
The Battle for Life (1846)
Martin Chuzzlewit (1843-1844)
Dombey and Son (18461848)
David Copperfield (18491850)
Bleak House ("A Casa Abandonada", "Casa desolada" ou "Casa sombria") - (18521853)
Hard Times ("Tempos Difíceis") (1854)
Little Dorrit ("A pequena Dorrit") - (18551857)
A Tale of Two Cities ("Um conto de duas cidades") (July 11, 1859)
Great Expectations ("Grandes Esperanças") - (18601861)
Our Mutual Friend (18641865)
The Mystery of Edwin Drood (inacabado) (1870)

sábado, 19 de dezembro de 2009

Clímax



Clímax. Clímax. Max clima. Uma noite, um vinho e um sofá. Dois copos. O fluxo é arrebatador. Flores e folhas verdes espalhadas pela varanda. A garrafa holandesa foi quebrada ao mesmo tempo que um pedaço de você chegava pela primeira vez dentro de mim. A objetividade é a essência da arte dramática. E do amor? Será?
Fui amada antes do amor chegar. Te lambi e me perdi nas entranhas recheadas de pelos das quinas do teu ser.
Clímax. Desenho dos persongens. Que pessoa atrás da persona haverá? Quem somos nós?
Clímax, organização de ações. Uma ação após a outra, encadeando acontecimentos em imagens inesquecíveis.
Parece que foi ontem, parece que poderia ser pra sempre. Talvez, o poder do argumento nos traga de volta a sensação do apogeu. Todavia, já há um desenrolar da estória feita de um momento infinito que acordou entre dois corpos. É óbvio que o pra sempre não se demora a partir e concomitantemente a estória insiste em se prorrogar. O fluxo casual pede para ser costurado pelas suaves mãos de um artista. O ápice dramático não chega a lugar algum sozinho.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Nina Simone



Ain't Got No / I Got Life
Nina Simone

Ain't got no home, ain't got no shoes
Ain't got no money, ain't got no class
Ain't got no skirts, ain't got no sweaters
Ain't got no faith, ain't got no beard
Ain't got no mind
Ain't got no mother, ain't got no culture
Ain't got no friends, ain't got no schooling
Ain't got no name, ain't got no love
Ain't got no ticket, ain't got no token
Ain't got no God
What have I got?
Why am I alive anyway?
Yeah, what have I got?
Nobody can take away
I got my hair,
I got my head
I got my brains,
I got my ears
I got my eyes,
I got my nose
I got my mouth, I got my smile
I got my tongue, I got my chin
I got my neck, I got my boobs
I got my heart, I got my soulI got my back,
I got my sex
I got my arms, I got my hands
I got my fingers, Got my legs
I got my feet, I got my toes
I got my liver, Got my blood
I've got life,
I've got my freedom I've got the life
I got a headache, and toothache,
And bad times too like you,
I got my hair, I got my head
I got my brains, I got my earsI got my eyes,
I got my noseI got my mouth, I got my smile
I got my tongue, I got my chinI got my neck,
I got my boobiesI got my heart,
I got my soulI got my back, I got my sex
I got my arms, I got my hands
I got my fingers, Got my legs
I got my feet, I got my toes
I got my liver, Got my blood
I've got life, I've got my freedom
I've got life,
I'm gonna keep it
I've got life, I'm gonna keep it
Dois vídeos ótimos da musa Nina Simone.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Linguagens do amor



Um exercício prático aos amantes, casados, namorados e afins.


Ontem ouvi falar de um livro que eu nunca compraria em uma livraria, confesso. Porém, as falas de um grande amigo me tocaram na alma. Ele citou o tal livro: As cinco linguagens do amor, Gary Chapman.
Que bom a paixão! Uma delícia! Um sentimento forte, que nos faz fazer tudo para agradar o outro. Tudo fica lindo quando a paixão impera! Nesse estágio de envolvimento amoroso nós não nos encontramos conscientes dos defeitos e fraquezas dos outros. Porém, depois de um tempo nossos sentimentos mudam. As coisas que não nos irritavam começam a incomodar e já não estamos dispostos a fazer “tudo”que o outro quer. Torna-se muito difícil agradar o outro quando não queremos.
Então, o casal se encontra na “crise chinesa” perigo/oportunidade. Ou aprende-se a linguagem do outro ou aprende-se a comunicar seu amor ou a relação enfrentará problemas sérios. As pessoas são muito diferentes na maneira em que mostram o amor e na maneira que querem ser amados. Imagine que o outro precisa se sentir amado tanto quanto você, entretanto não “como”você. Se os dois percebem o que é importante para o outro a relação provavelmente prospera.
Haja generosidade! O outro pode ser completamente diferente de você! Segundo Gary, exitem cinco linguagens fundamentais que expressamos nosso amor e nos sentimos amados:
Palavras de afirmação- Tem pessoas que precisam de sentenças afirmativas para se sentirem amadas. Para estas muito mais importante que as críticas são as afirmações: vai lá amor! Você está linda! Você é bom! Você consegue! E assim por diante.
Serviço- Ajuda prática por parte do outro. Aquele macarrão especial feito com amor, um bilhetinho de apaixonado, lavar uma louça, dar uma carona na hora do rush, etc. Tem pessoas que se sentem amadas quando o outro dá demonstrações “práticas”.
Presentes- Notem isso não tem nada a ver com condição financeira. É aquela coisinha que você viu e lembrou do seu amor. Um caju doce que você traz, um par de meias, uma jóia, uma lixa de unhas colorida, flores, bombons, camiseta de time de futebol, etc. Tem pessoas que se sentem amadas quando são lembradas dessa maneira. Estas vão ao êxtase quando ouvem: Lembrei de você!
Intimidade física- Há pessoas que gostam de ficar “grudadinhas”. Isso não significa carinho nas partes genitais necessariamente. Andar de mãos dadas, sentar juntinho na hora do almoço, um beijo quando se chega em casa. Tem pessoas que se sentem amadas com o toque físico.
Tempo de qualidade- Pra estes ainda que sejam só 10 minutos no dia que fiquem juntos o tempo precisa ser intenso e pleno. Algumas pessoas se sentem amadas quando o outro dedica um tempo de qualidade para demonstrar seu amor. Chegar em casa depois de ter estado o dia todo fora, ligar a TV e pedir para a esposa sair da frente seria uma catástrofe. É preciso considerar que uma semana de viagem pode significar uma ausência que pode ser compensada em menos de um dia.
Voltando a proposta do exercício prático; que tal observar o seu companheira/o e identificar quais são as duas linguagem mais fortes que se sente amada/o. E claro, é necessário praticar essas linguagens com o outro. Lembrem-se o outro não é igual você. Você pode gostar de palavras de afirmação e serviços. Detestar ficar “grudadinho”, por exemplo. Mas, se seu companheira/o gosta porque não aprender a linguagem do outro?
Achei bem generoso. Parece que pode funcionar em todas relações pessoais. Generosidade gera generosidade. Desprezo gera desprezo. Recebemos de volta o que doamos. Se doarmos nosso amor certamente seremos amados. Perceber o outro e ser percebido parece ser uma das chaves do amor.

Insígna de um calabouço


Salvador Dalí
A maior parte das vezes, a chave da prisão está dentro da cela.
Muitas vezes, dentro de nossas costelas.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Emancipação da anguzada



O Desmame Do móvel-Alimento. Salvador Dalí



" No entender de Sartre, estamos "condenados à liberdade"; não há limite para nossa liberdade, exceto o de que "não somos livres para deixarmos de sermos livres." Porque não há nenhum Deus e portanto não há qualquer plano divino que determine o que deve acontecer, não há nenhum determinismo. O homem é livre. Nada o força a fazer o que faz. "Nós estamos sozinhos, sem desculpas." O homem não pode desculpar sua ação dizendo que está forçado por circunstâncias ou movido pela paixão ou determinado de alguma maneira a fazer o que faz.
A angústia. Seguindo a Kierkegaard, Sartre usa o termo "angústia" para descrever essa consciência da própria liberdade. Nós estamos livres porque nós não podemos confiar em um Deus ou na sociedade para justificar nossa ação ou para nos dizer o que e quem nós somos. Nós estamos condenados porque sem diretrizes absolutas, nós devemos sofrer a agonia de nossa tomada de decisão e a angústia de suas conseqüências. A angústia é, então, a consciência da própria liberdade... A angústia é a consciência dessa liberdade de escolha, a consciência da imprevisibilidade última do próprio comportamento... Uma pessoa à beira de um penhasco perigoso tem medo de cair, e sente angústia ao pensar que nada o impede de se jogar lá embaixo, de se lançar no abismo.. O pensamento mais angustioso de todos é quando, num dado momento, nós não sabemos como nós iremos nos comportar no momento seguinte. "Sartre por Rubem Queirós Cobra

Tem um escalar as mahãs sonolentas
para se enxergar além dos sonhos - eu mesma

Angústia
Sabotagem
Feliz eu?
Quando vou deixar de me trair?
Quando vou deixar de calar verdades na terapia?
Quando vou ver realmente quem sou eu?
A massinha que moldei meu ser desmoronou
Estava fraca a procriaçào que saia de mim:
Pedaços de orgàos, pele, cabelo, olhos
Estou no chão
Criei um ser humano de massinha
Tinha uma perna tão resistente
Porque não aguentou a cabeça?
Será que os olhos estavam abertos demais?

Vigília


Anoitece no peito um buraco profundo.
A dor é do tamanho do mundo.
Mundo tem tamanho? Tem.
Então, qual seria a medida do universo?
Alguém tem fita métrica?
Que extensão o globo tem?
Será a dor mensurável ?
Um orifício inflamado no Universo será o infinto?
Anoitece palavras na madrugada.
E merdas no ventilador
Nessa taciturna madrugada findei com um sonho.
Tristonha acordei sem dormir.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Camoeca


Madonna- Eduard Munch
Palavras caem, de um peito esfumaçado, sem começo e com muitos pontos finais. Parece que foi ontem. Parece que seria pra sempre. Por que nada é pra sempre? Por que? Em todos os recantos há gosto e cheiro. Em alguns cantos se descobre o desejo. Por que atropelamos os pés pelas mãos? Poderia ser tudo. Seria tão e tão bão! Todavia mulheres e homens não são o que poderiam ser. Tudo passa tão depressa.

Felicidade? Onde estará? Alguém viu? Estará esta ventura dentro da solidão? Até quando doses de felicidade devem ser aumentadas pelos médicos? Mais uma dose? Mais um! Mais um! Mais um!
Hoje, o único olhar verdadeiro que me perpassou foi o do garçom. Até hoje nada de entregas, nem acolhidas. Será pra sempre decepção? Sempre?
Lágrimas caem do céu estrelado. A boca do dileto não soltou nenhum som de amor. Seria ilusão a noite na cama tisnando? Que tem a ver sexo com amor? Que tem a ver a pessoa medrosa com a entrega? Amor é coragem. Onde diabos neste mundo haverá alguém sem medo na alma? Onde haverá alguém que olhe nos olhos profundamente? Onde haverá alguém que eu possa repousar meus pensamentos em seu peito sem medo de ser traída?
O vento sopra atrás da janela do apartamento. Aqui é quente. É preciso entender a insônia. Temos que ter parcimônia. Temos que fazer isso e aquilo. Temos? Essa maldita dor no peito parece que some, contudo ela volta e volta e volta.
Um sofá azul me engole e uma cama branca me cospe sem dó. Será renascer um momento estouvado? Serei eu fadada a não amar? Acontece que amo e amo e amo. Amo: pessoas, pensamentos, coisas, animais, plantas, crianças.... Amo. Como amo tanto e ainda não estou plena? Quem me nega de ser feliz sou eu mesma?

Perífrase


Um pássaro lânguido beija uma flor. Será de fome ou de amor?

Retumbam alvas preposições


"Depois que desliguei o telefone me arrependi de ter ligado, porque a emoção esfriou com a voz real" Ana Cristina César


O calor está de arrasar. Suando por todos os poros acordo enxarcada no meio da madrugada. Antes fosse enxarcada de sexo. De gozo. Todavia, é só o suor que me inunda. Lágrimas notívagas custam a secar. Será que a água salgada evapora mais lentamente? Ou é a dor que demora mais que a alegria na vida ?
A cama continuou a me cospir. Queria um abraço. Teve um aperto de mãos. Que diabos nos faz querer tanto e ficar quase sem nada?
Esse novembro acalorado acordou com mais uma manhã fora de casa. Em que casa eu estou? Quem acorda ao meu lado? Desespero. D-us toca uma camapainha no meu cérebro: que pode um simples mortal saber sobre destino?
Seria tudo acaso? Ou um acúmulo de casos?
Tem uma sentença que não engoli bem. Uma frase resmunga o passado em meus tímpanos. Tem uma frase que está deixando meu coração surdo. Desligo definitivamente o telefone mudo.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Conto "O Anjo"



Marc Chagall
O Anjo




O barulho da moto era inconfundível. Uma Harley- Davidson. Só podia ser ele, meu amigo Vitor, que de certo viera me vistar, tomar uma cerveja e com certeza apreciar o cemitério. Moro próximo a um grande cemitério, onde o avô de Vitor esculpiu uma linda capela feita de anjos celestiais de mármore. Ás vezes o cemitério é florido, chega parecer um privilégio morar perto de tão silencioso jardim.
Confesso que nunca me identifiquei com cemitério e afins, até presenciar os acontecimentos da vida de Vitor. Ele sempre será um amigo especial , o irmão que não tive. Para muitos de nossa convivência tínhamos estranhas semelhanças, quero dizer a nossa cabeça parecia ser do mesmo santo, e ainda o que era mais incrível para nossos amigos de ginásio é que tínhamos o mesmo nome. Meu primeiro nome também é Vitor, apesar de muitos me chamarem de Neto por ser um nome herdado do meu avô.
O fato é que Vitor marcou minha vida. Ainda me lembro do nosso otimismo estudioso. Organizávamos uma revista chamada “Ensaios sobre Pintura & Escultura”, patrocinada pelo pai de Vitor, um grande empresário diga-se de passagem. Essa revista era um orgulho para mim, popular no meio universitário, chegou até a circular em alguns museus e centros culturais. Entretanto, não durou muito nosso idealismo juvenil, não entendíamos de marketing e o retorno financeiro era cada vez mais escasso. Cairíamos no mundo dos leões e sabíamos que não tardaria o dia em que seríamos devorados. Foi o que aconteceu no último ano do colégio.
Eu continuei com a pintura e a escultura, e hoje tenho um ateliê. Vitor decidiu aprofundar-se na arte da ciência, foi estudar medicina. O médico pra mim é o maior artista do corpo humano. Infelizmente, eu sempre fui alérgico a formol, benzina e cheguei a sentir náuseas quando fui obrigado a presenciar a hemorragia de uma tia. Já Vitor era um artista-cientista.
Ele ficou na cidade grande, para mim muito mais cinza que o meu vizinho cemitério. Sem falar no trânsito, horário de pico e o diabo a quatro. Lá na metrópole Vitor se aprofundou nos estudos e casou-se com Julie. Menina linda, pele branca e cabelos negros e longos. O danado do meu amigo tinha sorte ou pelo menos nunca teve azar com as mulheres.
Vitor sumiu por um bom tempo. E depois de cinco anos ouço o barulho da sua moto? O cão late. Alucino na idéia de que só pode ser Vitor. O barulho era de sua moto.
O sol estava em um alaranjado, quase vermelho aquele fim de tarde. Em bairro considerado distante como o que moro é permitido ter ruas de terra. A avermelhada poeira dança no ar. Saio no portão principal e Vitor cheio de poeira vermelha estava ali, veio me visitar. Não pode ser! Olhei, achei mais magro. Mas, era ele: Vitor. Os olhos de meu amigo estavam esbugalhados e enigmáticos. Sem demora convidei-o para entrar.
Nos abraçamos e senti que algo não ia bem. Apesar de tímido Vitor sempre foi o mais animado da turma. Desta vez ele não estava trazendo nenhuma garrafa de vodca. Nenhuma piadinha de mal gosto na entrada? Aquilo tudo era um mistério pra mim. Então ele se afundou na poltrona de veludo vermelho e disse:
- Meu irmão, eu preciso usar seu ateliê por um tempo.
Olhei para ele desconfiado. Usar meu ateliê para o quê? Ele acendeu uma cigarrilha importada; porém a mão parecia doente perto da cigarrilha,tremia e estava imunda.
- Neto, você sabia de meu amor por Julie?
Hesitei por um instante, os olhos de Vitor estavam parados, estáticos. É como se saltassem da poltrona vermelha que ele estava afundado. Assustado balbuciei que sim.
- Julie morreu.
Não sei porque mas minha reação foi um espirro. Na verdade, foi uma crise alérgica, uma defesa física, um tipo de premunição orgânica.
Então Vitor me contou em detalhes a vida dele com Julie, a morte de sua amada e os seus desejos, quero dizer a obsessão que tomava conta de seu futuro.
Julie havia morrido em um acidente de moto. E eu sabia que Vitor era apaixonado por motos. As motos nos dão a sensação de aventura. Os casais parecem mais sensuais em cima das motos: agarrados, com o vento fazendo festa pelo corpo, os lábios gelados como quem tomou sorvete, as imagens passando agitadas. Todas as semanas ele levava Julie passear de moto. Sem nenhum compromisso, só passear. Ele quase sempre passava na portaria de algum cemitério, parava a moto e os dois ficavam em silêncio. O silêncio ali era respeito, amor. Era o barulho das folhas caindo, o ar cinza e vermelho do cemitério.


Julie que desde garota sonhava com o príncipe encantado, estava ali passeando no cemitério com seu príncipe magro e um tanto disforme. Maldade, para Julie ele era inteligente, gostoso, e além de tudo ela achava que aquele óculos dele era um charme, ela sentia tesão por seu ar de intelectual. Tanto tesão, amor, que ela adquiriu o hábito de passear no cemitério, sentia uma feliz nostalgia. Lá o verde era bucólico porque era quase cinza, quase feito de cinzas e rosas vermelhas.
Eles estavam habituados ao passeio semanal. Vitor sentia a tranqüilidade viva e escrevia e respirava livremente. Ele não suportava o parque do Ibirapuera aos domingos, era congestionado, um passeio condicionado a padrões sociais. Mas, no cemitério havia esculturas lindíssimas, e ainda podia fazer amor nos vales mais escondidos.
Uma noite foi especial, Vitor disse:
- Eu vou te levar em um lugar maravilhoso. Quero que você vá de olhos fechados. Vou te levar para conhecer um delírio que eu chamo de “O anjo”.
Julie caminhava no escuro. Quando abriu os olhos “O anjo” tomou proporções inacreditáveis. Era o mais lindo que já havia visto, delicado e forte como só as belas esculturas podem ser. Tinha as mãos delicadamente pousada entre as pernas, era prateado e reluzia como um holofote. A estrondosa beleza arrancava lágrimas de Julie. Ela estava consumida pela imagem, o frio percorria sua coluna como um presságio, um calafrio. Os olhos de Julie percorriam cada milímetro do Anjo. Havia uma legenda: “Artistas Indigentes”. Um novo arrepio na coluna. Quis sair dali imediatamente, porém não se moveu. Sentia um misto de dor e tesão. Ela queria ser amada naquele momento mais do que nunca.
Julie tirou a calcinha, encostou no muro do cemitério e disse sussurrando para Vitor:
- Você vai me amar para sempre?
Ele se sentiu um fatalista, mas aquela mulher era tudo. Gaguejou e disse:
- Para sempre.
As mãos dela desceram do peito para a barriga, fez festa no umbigo, desceu para o seu sexo e pediu:
- Me ama aqui no muro do cemitério?
Vitor sentiu o seu membro maior do que nunca. Ele foi levantando a saia dela. As mãos dele foram subindo passeando pelas coxas bem torneadas, pouco a pouco o corpo dele foi ocupando todos os espaços do corpo dela. Ela gemia e via o anjo. No muro do cemitério gozaram múltiplas vezes. Gozaram o amor eterno. Julie sentia um líquido quente escorrendo pelas suas pernas. Eles sentiam amor verdadeiro.
Ficaram muito tempo sem palavras. Viviam um silêncio magnífico onde não julgavam nada, só dançavam aquele momento numa dança interior sem fim. Depois de muito tempo Julie salta mansa e ágil como um gato subindo no muro. A imagem dela é como a de um totem: cabelos esvoaçantes, coxas meladas do mel mais puro que possa existir, a boca recheada da saliva de Vitor. Julie confessa como se nunca houvesse dito isso:
- Eu te amo Vitor!
Ele abraça Julie, um abraço tão forte que ele chega a sentir o coração dela pulsando em seu peito. Vitor percebe que as horas se passaram rapidamente e diz:
- Já está tarde, vamos embora.
Caminham de mãos dadas. Vitor pensa que é gostoso sentir a mão de Julie. E só de pensar que na adolescência ele achava careta andar de mãos dadas! Ah! Hoje é como se ele estivesse tocando a buceta dela. Como ele pudesse sentir a alma dela emanando naquele contato entre duas mãos. Nesse encontro de mãos era possível sentir a arte do amor presente no corpo humano, na casa do espírito.
Subiram na moto e quando saíram do cemitério Julie balbuciou no seu ouvido:
- Quando eu morrer eu quero uma escultura dessas- apontou o anjo que se via já muito longe. Uma escultura linda no meu túmulo!
Os cabelos longos de Julie voavam. Vitor apreciava pelo espelho da moto aquela boca carnuda, aqueles cabelos em festa, as mãos dela pousadas em sua virilha, as imagens atropelando-se na velocidade da moto. Ele se via tomado de um enorme tesão. Apesar do barulho da moto ele podia ouvir Julie repetindo quase feliz:
- Eu quero uma escultura, uma linda escultura como aquela dos “Artistas Indigentes”
Se Vitor pudesse reter a vida! Ele descobriria uma infinidade de planetas habitáveis e caminharia por todos eles de mãos dadas com Julie. Vitor ria dos seus próprios pensamentos. Ele, o eterno viajante solitário. Ele que mesmo sem querer visualizava tragédias, que já havia estudado o processo de putrefação. Logo ele que havia se julgado ateu, agora queria eternizar a vida!
Um mês depois, os dois tinham ido passar o final de semana em um sítio que era relativamente próximo de onde moravam. No caminho de volta, havia uma mancha de óleo na estrada. Julie se desprendeu da moto. Essa maldita mania de andar sem capacete! Tudo bem que era uma estrada conhecida, mas porque essa mania de achar que só com a gente não acontece?
Julie viu tudo lentamente. Sempre havia achado que as imagens sob a moto se movimentavam rapidamente, agora elas eram paradas. Ela sentiu a pancada na cabeça, e o corpo foi adormecendo pouco a pouco. Era evidente que Vitor não tinha culpa. Ele desesperado, gelado de pânico não poderia estar enganado, Julie tivera morte instantânea.
Desespero e escuridão. Ele passou a viver quase sem comer, sem falar, sem respirar. Em suma, passou a viver quase sem viver.
Vitor passou então a dormir sozinho na cama de casal que tinha o cheiro de Julie. Ele abraçava o babydoll de Julie todas as noites para dormir tranquilo. Uma noite, ás quatro da manhã, Vitor acorda suado e dentro de sua cabeça ecoa:
- Uma estátua mais bonita que a dos artistas indigentes. Uma estátua...
Ele se levanta em um só golpe e sai de casa sem ligar a moto para não fazer barulho. Na esquina, liga a moto decidido: cemitério. Durante o caminho conversa sozinho:
- Pensa que eu vou dar uma estátua pra Julie? Vou dar uma coleção de estátuas, construir um ateliê de esculturas só pra ela.
As mortas merecem amor. Vitor está decidido que Julie não passa mais uma noite sozinha no cemitério, ainda mais sem o desejado presente, a estátua.
Vitor queria ninar Julie, fazer cafuné, presenteá-la com as mais ricas jóias e especiarias. E porque não realizar também o seu desejo oculto? Estava certo que iria eternizar Julie para que eles pudessem continuar concretamente se amando. Ele deixa o perverso pensamento escapar como um sussurro entre os dentes:
- Vou embalsamá-la.
Passa uma sequência de árvores, o silêncio e a coruja. Vitor chega ao cemitério. Andando com passos largos e livres, procura o coveiro. Encontra o homem das tumbas adormecido na sepultura de uma japonesa. Olha aos arredores, há resíduos de festa. Vitor apanha um brigadeiro perdido no chão e o coloca próximo a imagem da morta. Vem á sua lembrança uma festa que havia ido quando tinha dez anos, uma festa com muitas comidas e bebidas. Foi exatamente com dez anos e seis meses que ele perdera a colega de colégio chamada Mariana. E que colega! Era a oriental mais linda que já havia visto, seu membro chega a fazer uma menção involuntária. Ah! No dia do cortejo Vitor queria morrer para ter uma festa igual aquela e poder deitar-se ao lado daquela menina de cabelos lisos e pretos. Menina tão magra que mal podia se ver os seios, existia uma ingenuidade em Mariana de comover a alma. Foi ela quem incentivou Vitor passear no cemitério, doce lembrança.
Vitor ouve o ronco do coveiro, volta a realidade e percebe que precisava agir naquele momento. O coveiro com uma garrafa de Fogo Paulista na mão, ele, e só ele poderia ajudá-lo naquele momento. Decidido Vitor tenta acordá-lo:
- Ei, ei o senhor pode me ajudar?
Nenhuma resposta. Vitor cutuca o ombro do coveiro, e nada, o homem dorme como uma pedra. Então ele resolve se aproximar da orelha do homem e falou com vigor e intensidade que ecoaram no cemitério:
- Ei, ei, eeii! O senhor pode me ajudar? Acorda!
- Ahmmmmmm!
O coveiro produzia uns grunhidos. De repente sai do vão entre o pé do coveiro e a tumba uma barata voadora de uns cinco centímetros. Seria real? Vitor tinha um sincero pavor de baratas. Ele, então gritou:
- Ei me senhor tá difícil de acordar não é? Então vou levar essa garrafa pra mim de presente!
Quando vai pegar a garrafa o coveiro em um sobressalto se levanta e diz:
- Malandro que é malandro não atravessa tumba alheia, quero dizer não interfere nos bens, quero dizer no sono, quero dizer... Mas afinal o que é que você quer? Desembucha rapaz, quer roubar dentes é? Os dentes de ouro estão em falta, parece que ninguém mais quer gastar com dentista.
O coveiro explode em uma gargalhada. Vitor sem entender é tomado de um enjôo sem tamanho quando vê a barata pousada no bico da garrafa do coveiro, mas engole a azia e tenta explicar:
- Meu senhor, eu venho trazendo uma boa quantia em dinheiro e o que eu quero é o corpo de uma morta, mas ninguém, ninguém compreende? Ninguém pode ficar sabendo, talvez o corpo de algum indigente deva ir para o caixão.
- Ai meu irmão, quanto morre? Quanto é que é hein? Cem reais já vou adiantar que não aceito!
Vitor retruca rapidamente:
- Dois mil reais.
O coveiro cambaleia. Para quem ganha um salário mínimo por mês, e só come brigadeiro em festa de cemitério a proposta de Vitor era um sonho.
- O quê? Dois mil reais? Pode levar até dois se quiser. E não é que carne podre vale dinheiro? Eu... Eu nem sei direito o quanto é dois mil reais...
Vitor se lembra de Nelson Rodrigues, a frase de Otto que diz que o mineiro só é solidário no câncer. Era horrível para Vitor a idéia do suborno, mas o amor, a voz de Julie ecoando em sua cabeça o faziam não hesitar. Sentia uma forte náusea ainda causada pela barata, a cabeça ecoando: “Se você me ama me dá uma estátua”.



O coveiro demoraria dois dia para realizar o serviço em sigilo, tempo suficiente para ele decidir onde levaria Julie. Então Vitor chega a minha casa, ele, meu melhor amigo, com os olhos esbugalhados, cheio de poeira vermelha.
Agora eu me sentia uma testemunha, poderia ser um erro, mas eu estava decidido a ajudá-lo no que fosse possível. Já havia entendido o porquê do pedido do ateliê, e sabia que o galpão dos fundos seria perfeito, pois era grande, inutilizado e isolado das dependências da casa.
Entretanto uma questão continuava a me intrigar, como Vitor traria o corpo de Julie para cá? Me parecia inverossímil o corpo de uma morta em cima de uma moto, não resisti e ironizei:
- Mas Julie não ficaria bem no bagageiro da sua moto com aquelas...aquelas... Como chama mesmo? Ah! Aranhas.
Vitor fez questão de não me deixar na dúvida por muito tempo:
- Olha Neto, só você pode me ajudar. Lembra-se do seu tio Felício? Aquele que faz serviço funerário com uma perua branca, aquele aposentado da prefeitura. Ele está trabalhando em uma funerária particular, não é?
Faço sinal positivo com a cabeça, começo entender e penso que talvez ele tenha razão, afinal quase ninguém desconfia do óbvio.
- Você conseguiria que seu tio emprestasse aquela perua, alegando minha mudança provisória pra sua casa?
Gosto dessa capacidade que Vitor tem de ir direto ao assunto, ainda que isso tudo me assustasse naquele exato momento. Achei uma loucura, fiquei um bom tempo com os olhos pousados em Vitor afundado na poltrona vermelha, sua expressão era de quem estava doente, a beira da morte, e eu sabia que o remédio estava em minhas mãos. Mas, logo Tio Felício! Meter nessa estória um homem tão religioso, tão simples que nunca saiu dessa nossa cidade de fim de mundo. Eu sabia que era por isso mesmo que Vitor me pedia, Tio Felício não desconfiaria, era inocente,a ponto de acreditar na mudança repentina do meu amigo de infância. É certo que a viuvez de Vitor causaria compaixão, tocaria o coração de meu tio, todavia ainda assim ele poderia descobrir. Senti a sensação que eu costumava ter quando era menino, e estava fazendo “uma arte”, quero dizer quando estava prestes a fazer algo errado, mas fantástico. Nos encontrávamos decididos, e esse era um risco que estávamos dispostos a enfrentar. Ai! Se minha vó soubesse disso! Certamente diria que um absurdo desses só poderia acontecer comigo, e ainda resmungaria que a culpa era da minha mãe por não ter me batizado. Parece incrível, mas eu poderia até imaginar o sermão:
-Uma coisa dessas não pode ser de Deus, eu falo pra você rezar Vítorzinho. Eu rezo pra você todos os dias e você me dá esse desgosto! Roubar morto de cemitério, logo você meu neto!
Entretanto, assim foi feito, e em uma noite de agosto trouxemos uma pequena mudança, quero dizer uma mala, livros, discos e uma série de objetos inúteis que na verdade estavam escondendo o corpo de Julie. Ninguém desconfiou, afinal ele realmente mudou para minha casa. Era uma moradia provisória para Vitor, mas ficaria por tempo indeterminado. Ao chegar em casa, antes de descermos da perua, vi um brilho festivo nos olhos de Vitor. Começava o processo. Meu amigo viera acompanhado de caixas com diversas químicas. Uma pena , mas não pude ajudá-lo a carregar as caixas que exalavam cheiro, porque a alergia não dava um tempo. Espirrava, o nariz escorria, coçava as entranhas. Certamente eu não havia nascido para mexer com formol, éter, benzina ou afins.
Vitor instalou-se no galpão do fundo de casa, comprou na casa de materiais usados quatro banheiras brancas antigas, medindo o comprimento de aproximadamente dois metros cada uma delas. Comprou também um tanque de lavar roupas. Começou então a organizar as químicas. O galpão ficou repleto de químicas, as quatro banheiras e o tanque ficaram dispostos lado a lado, sendo que o tanque ficava ligado ao encanamento do banheiro. Quando pode-se ver o galpão de cima, do alçapão, tem-se a impressão que ele construiu um laboratório fotográfico. A planta baixa do galpão era um laboratório fotográfico fedendo a química. Parecia ser um processo artesanal, porém estava certo que Vitor se serviu de toda tecnologia possível para concretizar o seu sonho.
Não demoraria o início da putrefação no corpo de Julie. Vitor preocupava-se em fazer o processo ser o mais rápido possível. Afinal de contas ele não queria perder nenhuma parte do corpo d amada. O corpo de Julie estava intacto, como o corpo de uma deusa. O traumatismo cerebral não havia deixado seqüelas.
Meu amigo queria embalsamar aquela mulher, ele acreditava em embalsamar no seu sentido etimológico “impregnar de aromas”, introduziria no cadáver substâncias que o livrariam da podridão. É como se ele pudesse conservar o corpo de Julie com a carne gelada e macia, os olhos abertos, o cheiro bom depois do banho. Vitor daria banhos em sua amada, molharia todo o corpo de Julie com perfume francês, “Amor Amor”, seu predileto. O seu cheiro, seu perfume, o odor de rosas guardado em um vidro que ficava guardado no criado mudo, ao lado da cama de Vitor. Um cheiro ficava guardado na gaveta. Era magnífica a influência que o odor poderia causar em alguém, um efeito físico e psicológico resultante de elementos exteriores aos sentidos que produz sensações. O cheiro trazia lembranças, era impressionante o prazer que sentia quando afastava o cabelo de Julie mordendo devagarzinho a sua nuca, sentindo o pescoço exalar um cheiro de mulher. Ainda me lembro que antes de conhecer Julie, meu amigo achava um porre “fazer a mão”, depilação, jóias, perfumes e tal. Principalmente jóias porque são exageradamente caras.. Entretanto a esposa o fez acreditar que não havia problemas nas manias femininas. Julie era cuidadosa, seu jeito de mulher era quase uma pérola: suave, uma preciosidade escondida, jóia verdadeira e rara. Ele adorava quando ela vestia meias ligas, prendia na coxa as rendas escondidas atrás da saia. Naquele instante ela estava nua, singelamente branca.
Vitor passa mais de dez horas sem sair do galpão. A magreza consome pouco a pouco as carnes do seu corpo. Julie ficou por dias afundada hora em uma banheira, hora em outra. Vitor parecia mestre em músculos, nervos, pele e órgãos. Dizia até que era possível manter alguns reflexos no corpo dela. Para mim, honestamente aquilo era um mistério. Eu realmente não entendo nada de químicas; e a nomenclatura médica nunca me agradou muito, apesar de eu sempre ler bulas de remédios . As prescrições nunca deixaram de me impressionar pela quantidade de química que unem, chegando até a me provocar uma certa náusea.
Depois de um mês enclausurado no galpão, meu amigo me chama para ver sua obra-prima. Quando entrei no galpão pude ver, além das banheiras e do tanque, uma poltrona de veludo verde, onde longos cabelos, pretos e reluzentes cobriam as costas do móvel. Lentamente me aproximei de Julie, parecia que ela estava olhando para mim. Não sei mas tive uma sensação de enjôo, segurei o vômito quando percebi que de certo modo ele havia ressuscitado Julie.
Quando me aproximei , senti que o ar ao seu redor era gelado. Aquilo tudo para mim parecia psicose, doença mental da grave. Vitor sentou-se ao lado dela e falou calmamente:
- Neto, maninho, consegui alugar um ateliê na Rua Central. Você já passou em frente dele, não é? Suas esculturas terão lugar lá, posso levá-las amanhã pela manhã quando estiver fazendo minha mudança, se você quiser é claro.
O ar continuava gelado e eu não me sentia agradável com aquele corpo. Era como se Julie estivesse de alguma forma pousada naquele lugar, com os olhos bem vendados como de um falcão pousado no ombro de seu dono. Quem gostaria de ser imortal sem estar vivo?
Saímos do galpão e fomos jantar, quero dizer comer pizza e tomar cerveja, programa típico de Vitor. Eu ainda poderia apostar que ele pediria pizza de calabresa . Enfim, aquela noite bebemos e conversamos até a noite chegar, falávamos como se Julie não existisse mais, como se nada tivesse acontecido. Naquela noite percebi que sua relação com ela seria extremamente particular e a partir de agora nada mais me caberia saber, pelo menos era o que eu pensava.
O ateliê de esculturas na rua Central ficou realmente maravilhoso, as exposições eram muito bem recebidas pelo público em geral, cheguei a me recordar da revista que fazíamos juntos na adolescência. Vitor me levara apenas uma vez para conhecer o porão do ateliê, a casa de Julie, lá havia a escultura do Anjo. Fui com meu amigo buscar a adorável escultura. Quando chegamos naquele cemitério, antes de me deparar com o anjo, havia um homem dourado com as mãos pousadas na testa, como o comandante de um navio, querendo avistar todos que ali chegavam. Fiquei impressionado, pois parecia que aquela escultura tomava conta das demais, ainda assim apanhamos o magnífico Anjo.
Pensei que tudo estivesse encerrado e que o altar que ele havia construído para Julie era inofensivo a todos. Assim os meses foram se passando, Vitor continuava atendendo, em uma clínica particular, e fazendo prosperar o ateliê. Minhas esculturas tiveram reconhecimento público. As exposições iam de vento em polpa , na verdade vivíamos um ótimo momento e os negócios cresciam de forma inesperada.
Mas as mulheres! Sabia que não deveríamos ter funcionárias mulheres. Todavia foi inevitável, principalmente levando-se em conta que quem procurava emprego eram amigas de colégio, inteiramente unidas trabalhando afiadas. Inteligentes e gostosas. Não é difícil imaginar, Martinha e Catarine tomaram as rédeas dos negócios. Catarine era marchand, morena de pele branca com longos cabelos encaracolados e pretos. Era discreta e as curvas de seu corpo eram insinuantes quando suas saias delineavam seu quadril. Já Martinha era uma espécie de produtora executiva. Era ruiva, quente como vulcão incandescente, de cabelos longos, delicada, quase infantil. Martinha usava cada minissaia! Usa até hoje deixando-a com uma sensualidade devastadora.
Apaixonei-me por Martinha. Iniciamos um namoro tão quente quanto os pêlos vermelhos da sua púbis. Tão intenso que eu tinha a impressão que cada encontro valia por um ano vivido antes de conhecê-la. Poucas pessoas teriam coragem de viver uma amor tão intenso quanto Martinha. Eu já havia tido várias namoradas água com açúcar, mas eu gosto mesmo é de sentir meu corpo estremecer, de me apaixonar. Martinha passou a dormir em minha casa todos os dias e nunca mais se foi.
Em um fim de tarde Martinha veio me dizer que tinha uma surpresa para mim, disse que esta noite jantaríamos com um casal de amigos. Ela fez suspense e silenciou. Martinha pegou as chaves e me chamou para a porta de saída. Ela dirigia o carro, repentinamente procura um lugar para estacionar e para em frente a uma pizzaria. Eu sorri e me lembrei de Vitor. Foi como uma premunição, logo que entramos na pizzaria avistei Vitor. Vitor , a garrafa de cerveja e Catarine.
-Catarine? pensei alto sem poder me controlar.
Ela mesma, Catarine abraçada, quase agarrada nos braços de meu amigo. Pareciam um casal de namorados. Bem, eu já havia dito que ele dava sorte com as mulheres. Catarine estava visivelmente apaixonada por Vitor. Desde então vivemos momentos muito bons juntos.

Um dia Martinha veio me dizer que Catarine havia encontrado o diário de Vitor. Catarine havia arrancado uma página do diário que agora estava em minhas mãos:

“Sonho constantemente com Julie, temo estar prejudicando alguém que amo. Essa noite ela apareceu no meu sonho, bela visão que de certo modo me punia, disse bem assim:
- Vitor a única coisa que peço é que você, o homem que amo: Me abandone! Largue meu corpo. Por favor solte minha imagem! O amor não pode ser guardado em uma garrafa, não é uísque, que quanto mais velho melhor. Eu preciso partir! Sei que o amor o conduz a me prender assim. Veja, também amo as imagens. Mas acorda Vitor, é tudo ilusão. O corpo apodrece e eu quero sentir esse processo de putrefação. Não posso me sentir congelada por toda a eternidade. Meu amor, a morte me apanhou muito jovem, no auge de nosso casamento. Não é fácil para mim também. My sweetyheart, meu grande amor você sabe que sempre fui leonina com ascendente em câncer até as últimas consequências. Sempre desejei uma amor fiel que pudesse durar toda a vida, mas toda a morte também? Não é possível. Isso é pior que Carma. Tudo isso é parado como se debater no caixão sem poder respirar, fico me debatendo em um corpo que não se mexe! Você tira minhas roupas, lambe meus seios, mas eu estou gelada! Você não sente?Por Deus, não posso sentir o calor de sua saliva. Não vou negar que o começo desse endeusamento era bom. Mas, amor já não vive mais a casa do meu espírito. Não me prende! Eu preciso sair desse Olimpo que você construiu para mim! Mesmo que a gente continue se amando... Por favor...Me solta , por favor me solta...
O sonho se prolongou na minha mente e tudo ainda está confuso em meu cérebro, o fato é que preciso decidir se devo entregar logo o corpo de Julie a Iemanjá. Até amanhã pela manhã decidirei se será o fim dessa doce ilusão de eternidade. Parece que está perto o fim desse porão desconhecido.”

Quando terminei de ler aquela folha, percebi a parte interna do papel rasgada denunciando ser mais uma folha de um diário cheio de páginas. Fiquei branco, a pressão desceu, senti que poderia desmaiar. Suava e sentia a rinite alérgica nervosa tomando espaço em meu corpo.
Vitor estava apaixonado por Catarine. Ela o amava perdidamente, e isso não era segredo. Martinha chorava pela sua amiga, sabia inconscientemente que Catarine não suportaria tal traição. Traição sexual era muito diferente que se sentir traída por um amor eterno.
O telefone toca, era Catarine. Ela estava desesperada dizendo que estava no ateliê de Vitor e que naquele momento se certificaria de tudo o que havia lido no diário.
Catarine colocou o ateliê de Vitor de cabeça para o ar, até que encontrou o porão. Lá não estava mais o corpo de Julie, entretanto havia resquícios do altar montado, do local onde o homem que ela amava endeusava outra. Uma morta. Uma mulher viva no coração de um fingido que possuía seu corpo todos os dias. Quando ela poderia imaginar que um homem tão carinhoso fosse cometer uma traição tão fétida? Aquilo tudo provocou tamanho asco em Catarine, tamanha apatia; que por alguns minutos ela se sentiu paralisada. Naquele momento havia morrido qualquer amor a própria vida. Agora era só o ódio de ter sido traída.
Enquanto isso, sem imaginar o que lhe aguardava, Vitor cumpria a sua missão. Estava prestes a libertar Julie e recomeçar a vida. Era fim de tarde, o sol estava a pino e o mar reluzia nos olhos, era o dia perfeito para fazer seu lindo ritual de partida. Em um pequeno barquinho ele se despede da amada. Era um quadro de Monet a imagem que se via da beira da praia, o barco lentamente sumia mar adentro. Uma imagem cheia de cores, pontilhados que de perto só se vê um borrào de tintas e de longe uma imagem surpreendente, cheia de sombras, uma pintura inesperada para a ocasiào. Eu tenho uma mania de sempre lembrar de pintores e imagens em situações que me emocionam. Muita luz no último beijo que Vitor daria em Julie. Adeus. Adeus. Na volta para a praia Vitor só pensava em Catarine, pensava que queria ter filhos.
Pobre Catarine, as lágrimas afogavam seus últimos suspiros. Vitor tinha um quarto de descanso no ateliê, onde Catarine e Vitor costumavam ficar. No último andar da casa acabava de acontecer uma tragédia. Martinha e eu entramos no ateliê e avistamos a escada cheia de vidros quebrados. Catarine havia mexido nas caixas de químicas. Não só mexeu como quebrou vários vidros em um acesso de fúria. Não só quebrou os vidros como tomou uma overdose de morfina. A imagem era nostálgica: uma linda mulher morta na cama de meu amigo, melhor amigo.
Eu sabia que ele estava apaixonado por aquela mulher. Depois de Julie, Catarine foi a única a lhe tirar gargalhadas. Ela lhe dava a vida fora das doses homeopáticas.
O velório foi preparado ali mesmo, no quarto. Chegaram parentes, curiosos, jornalistas a fim de relatar a tragédia e os policiais a fim de desvendar o mistério. Vitor chega lentamente, um frio no estômago parecia fazê-lo prever a tragédia. Eu gostaria de abraça-lo, mas era impossível romper a névoa que encobria seu rosto. Chorava como criança. Senti uma dor no âmago quando Vitor beijou Catarine amorosamente e depois foi se afastando como bicho acuado. O barulho de pessoas que havia no velório, no quarto, desapareceu para meus ouvidos. Minutos depois ouvi um estrondo. Era o Anjo. Era Vitor explodindo o anjo com um murro que estilhaçou sua mão, fazendo voar pedaços prateados e vermelho do Anjo, de Vitor. Era a comunhão do Anjo, era o sangue de Vitor escorrendo pelas paredes.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Sra. Boal e Sra Freire


Marc Chagall
Eram duas mulheres na platéia. Elas são divas. Sorrisos largos que exalam vida. Elas são mulheres de verdade. Duas viúvas de dois gênios? Não, duas mulheres que serão eternamente mulheres de seus maridos.
Que lindas essas mulheres!
Que momento mágico vê-las no Teatro Arena, lado a lado. Só mulheres magníficas poderiam ser companheiras de homens geniais.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Anais Nin


Segue e antecede palavras de Anais Nin
.
"Não vemos as coisas como são: vemos as coisas como somos."
"A nossa vida em grande parte compõe-se de sonhos. É preciso ligá-los à ação."
"O único transformador, o único alquimista que muda tudo em ouro, é o amor. O único antídoto contra a morte, a idade, a vida vulgar, é o amor."
"Um homem jamais pode entender o tipo de solidão que uma mulher experimenta. Um homem se deita sobre o útero da mulher apenas para se fortalecer, ele se nutre desta fusão, se ergue e vai ao mundo, a seu trabalho, a sua batalha, sua arte. Ele não é solitário. Ele é ocupado. A memória de nadar no líquido aminótico lhe dá energia, completude. A mulher pode ser ocupada também, mas ela se sente vazia. Sensualidade para ela não é apenas uma onda de prazer em que ela se banhou, uma carga elétrica de prazer no contato com outra. Quando o homem se deita sobre o útero dela, ela é preenchida, cada ato de amor, ter o homem dentro dela, um ato de nascer e renascer, carregar uma criança e carregar um homem. Toda vez que o homem deita em seu útero se renova no desejo de agir, de ser. Mas para uma mulher, o climax é o momento em que o homem descansa dentro dela."
"Escrever deve ser uma necessidade, como o mar precisa das tempestades - é a isto que eu chamo respirar."
"Chorei porque não era mais uma criança com a fé cega de criança. Chorei porque não podia mais acreditar e adoro acreditar. Chorei porque daqui em diante chorarei menos. Chorei porque perdi a minha dor e ainda não estou acostumada com a ausência dela."

domingo, 27 de setembro de 2009

Devaneios III


Rene Magritte

Inspirado em Maysa

Em cada dia, cada noite, te acharei onde me perdi. A cada dia em uma estrela d'alma meu coração palpitará em luz. Três é o número? No fim da noite, as mãos se separaram; os rumos se trocaram. Nunca mais te vi. A cada dia, toda noite sofro de falta de fome. Sofri de excesso d'água nos olhos. Oh ! Estrela d'alma te acalme!
Eu sempre tive uma certeza: o amor é uma incerteza. Água demais pro coração. Eu quis amar mas tive medo de cair do abismo. Quis salvar o corpo e o espírito do desespero , mas o medo pode matar o coração. Isso eu não sabia até então. Nunca fiz coisa tão certa: perdi o medo do escuro. Minha casa vive aberta, abri todas as portas de meu coração. Hoje não há medo de perder, pois quanto mais generosa sou, mais o amor volta pra mim. Quanto mais cetim na cor do medo mais cortina aberta em mim.

Devaneios II



La magie Noire -1935 Magritte

“Aquilo não era nem uma cidade, nem uma igreja, nem um rio, nem cor, nem luz, nem sombra; era devaneio. Fiquei imóvel por muito tempo, deixando-me penetrar suavemente por esse conjunto inexprimível, pela serenidade do céu, pela melancolia da hora. Não sei o que se passava no meu espírito, nem poderia dize-lo; era um desses momentos inefáveis, em que sentimos em nós alguma coisa que adormece e alguma coisa que desperta”. Victor Hugo- En voyage
Devaneios perpassam noites solitárias. De emoções e raciocínios acontecem os dias. Confesso: nunca fui boa em números, nem em lógica. Fazer programa de computador ou resolver equação de segundo grau nunca me amamentou tanto quanto a métrica de uma poesia. Sinceramente: a fluência de uma boa prosa me engravida. Faço letras de alma. De amor. Obrigação mata por estrangulamento. Não quero me suicidar. Será? Não. Chega. Esqueça: sem estúpidas morais, por favor.
Vou até o fim do abismo, só se for de mãos dadas com você meu amor. O amor me deixa impregnada de vida. Essa noite as cores exalam um brilho de lua cheia. Enche de vida o destino: dias sopram manhãs de luz crepuscular que iluminam mais que sol apino. O tempo muda muito rápido. Será o aquecimento Global? Será o inferno aqui?
Silêncio! Pssss. Tem alguém me chamando. Será alguém de NYC? Ou de algum lado de lá que já me esqueci? Será eu em Paris, África ou Tunísia? Será meu amor no seu peito ou seu gosto no meu inteiro?
Te amo. Te amo mesmo antes de te amar. Te amo por te prever ao meu lado rindo um riso saudável que conforta o espírito vagante que mora em meu corpo. Amo tua miração. Fico aconchegada no calor de palavras perfiladas em perfeição. Para todo o sempre teu beijo me fará sorrir dentro dos teus lábios.
Sou toda-inteira. Toda eu. Toda mulher. Devaneando solitária passeio o corpo pelo edredom vermelho e os dedos trafégam o teclado do laptop.Tem uma tela iluminada que dorme ao meu lado. Parceira de cama. De palavras. De segredos. Me derreto com o calor que as ventoinhas sopram entre minhas pernas. Em devaneios amanheço o dia e logo me vejo online. Vultos se misturam em telas iluminadas e desaparecem entre bordas de chats . Sou banhada de azul.
Bom dia. Good morning. Buenos dias. Bonjour. Guten Morgen. Boker tov. Kalimera... Devaneio nessa modernidade.

sábado, 26 de setembro de 2009

Devaneios



Rene Magritte . Os sapatos vermelhos
“[...] no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente
no que eu digo. Ou pelo menos o que me faz agir não é o que eu sinto mas o que eu digo [...]” (LISPECTOR, 1980, p. 21).


Tem uma angústia vinda de não sei. Hoje, uma mulher segurou a minha mão e me disse chorando que sua vida não prestava. "Minha mãe só briga comigo", disse a mulher de quarenta e tantos anos. Ela, totalmente deseperançada. Eu, pensei: o amor o que é? Gosto de um no outro? Gosto deles e fico vazia. Gostando não me deixo gostar? Vai para além das expectativas a internação de Manuel. Um rapaz tão cheio de graça que um dia ficou louco. Assim mesmo: enlouqueceu do nada. A família nem entendeu. Mandou o rapaz pra fora dos seus aposentos. E só o deixou retornar quando ele recebeu o direito de um salário, benefício, dinheiro. Então, a família recebeu o menino-homem. Porém, familiares não se deram por satisfeitos; interdição foi a próxima palavra que usaram. Manuel pergunta assustado: “Interdição é pra sempre?”.
Tinha outra mãe no recinto que nos encontrávamos. Preocupada. Doente ela própria. Que fazer? As pupilas e as vísceras se retorceram na questão: como um doente segura outro doente quando os dois estão desmaiados?
Se assim fosse os quartos de hospitais não precisariam de enfermeiras; só pacientes que se cuidariam concomitantemente. Seria fácil, todavia a realidade é outra e dura.
Daydreaming é necessário, diz um amigo. Ao sonhar já penso no susto que será meu despertar na manhã seguinte. Quem sabe ainda seja madrugada quando pela manhã canta o galo? Quem sabe ainda. Ainda.
A cama suga. Entretanto, o melhor lugar da casa é o quarto. Aconchegante e solitário. Porque tantos diabos e santos no mundo? Porque tanto o que fazer? Não sou máquina. Não e não. Vou contra as muros. Todavia, me despedaço em cacos de carnes pulsantes quase todas as noites. O plural sempre dá problemas. Se escrevo assim ou assado. Vi ela ou viela. Tem diferença. Eu a vi. A forma interessa? Como objetivar o conteúdo e a forma concomitantemente? Esse é o caminho: o número dois.
Dois! Será possível o número dois? Se eu fosse matemática questionaria os pares. Matemáticos teimam em dizer que não mentem porque são racionais. Mentiras? Gosto mesmo são dos momentos oníricos. Ah, do lado de cá sonho com meu homem me dizendo que me ama pra sempre.
De onde vem as palavas multicoloridas? Gosto das cores, mas estou tocada por um destino abstrato incolor. Estou aplacada com o acaso. Intrigada com o futuro que desconheço. Para onde vou se estou com a cabeça zonza? Para onde vai a energia de quem está sem equilíbrio e decisão? Mas...Por que diabos a decisão tem que existir? Entretanto, se não souber fazer escolhas, nunca serei eu mesma: na integra.
Já imaginou o que é ser na integra? É mais do que uma dor. Mais que amor incondicional. Mais abundante que a água doce no Belém do Pará. Mais que. Ser na integra é alcançar o supremo. O êxtase. O gozo de estar inteiro, aqui e agora.
Há algo melhor do que estar presente no aqui agora? Algo melhor que degustar o presente seja lá qual for? Existe algo mais pleno que hoje, agora?
Amanhã pode não existir. E ontem já passou. Hoje é o supremo. E só vivo hoje se vivo na integra. Eu, self inteira.
Sufoco com porcas pequenas traições. São idiotas as falhas, se na essência se diz a verdade.
Se amo, o faço com todos poros e veias. O agora é corpo e espírito. Alma e razão. Decisão e dança. Amor e amor. Decisões estão recheadas de responsabilidade, mas a decisão não deve abarcar culpa. Quem sente culpa não decidiu. Está sem decisão interna. E o arrependimento? De que adianta esse tal arrependimento? O que adianta são atitudes. As ações internas e externas importam, inclusive muito e mais do que o discurso.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Fragmentos


Henry Miller


Anais Nin


Carta de Henry Miller a Anaïs Nin - Fevereiro de 1932


"[...]terrivelmente, terrivelmente vivo atormentado, e sentindo absolutamente que preciso de você [...]Anaïs, fique do meu lado. Você me envolve como uma chama acesa.[...] Anaïs, quando penso em você, em suas pernas apertadas contra mim de pé, no quarto, tremendo, em cair sobre você na escuridão e não saber de mais nada. E estremeci e gemi de prazer. Estou pensando que se tiver de passar o fim de semana sem vê-la será insuportável.[...] mas tenho que vê-la. Não tenha medo de me tratar friamente. Será suficiente ficar perto de você, olhar pra você com admiração. Eu a amo, é tudo."

("Henry & June: diários não expurgados de Anaïs Nin (1931-1932)", de Anaïs Nin. )

Holoplâncton amoroso



Monet "A primavera"


Para meu futuro e presente amor


Um cheiro de homem
Invade
Respirando tua alma
Tonteio com olhos cor de jade

Molho os poros ao sentir teu pelo
Arrepio a pele ao ver-te no espelho
Dentro e sem fim
Fundo e sempre, te dou o mais profundo de mim

Beijo seus lábios
Sem certeza, medo ou besteira
Beijo teu peito e sinto zonzeira
Sou este momento: tua e inteira

Casos passados não interessam
Em corpo e alma nossos seres se mesclam
De agoras se eterniza nosso futuro:
Você e eu quebrando qualquer obsoleto muro.


Juramento


Romeu e Julieta


De uma Julieta outsider para um Romeu inside.
When he would appear in front of my eyes I'd be falling on the floor dramaticaly
To raise up , lighter and stronger
Better than ever
The realism it will be alive between a lot's of fantasy
When it will be our day baby? Don't kill me! Please say! When?

Me perdi onde comecei, amando aos avessos
Só sei o agora desse novelo, sem fim nem começo.
Amansei o ciúme e disfarcei passando a mão no cabelo
Mas, nada de racional no manejo e dentro do rolo me vejo
E então o que faço? Choro e te beijo


Amanhã não sei
Hoje sou tua
Ontem já desencarnei
Agora sou toda alma nua: pura


Gosto do gosto de gostar
Encharcas de céu meu corpo com o mistério do teu olhar
Licença de perguntar?
Queres comigo te casar?


No ínfimo de ser, penso no amor que te darei
Por noites e dias com meu leite te alimentarei
Dentro dum sorriso eterno d 'alma tua pra sempre serei.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Prosa Livre


Kalachakra (tib. dus kyi 'khor lo / Dükyikhorlo), ou Roda do Tempo em sânscrito
"Se estivermos aptos a ver as energias do universo como realmente são, então as formas, cores e padrões se sugerem; Esse é o significado do Mahamudra, que significa "grande símbolo". Todo o mundo é um símbolo, não no sentido de um sinal representando outra coisa, mas no sentido de culminância das vívidas qualidades das coisas como elas são."
(Chögyam Trungpa, The Mith of Freedom and the Way of Meditation)
"A mandala representa a auto-identificação do microcosmo (a pessoa humana) com o macrocosmo que, para uma pessoa não-iluminada, possui a natureza do samsara; reciprocamente, ela se revela como a expressão perfeita da iluminação quando todas as diferenciações errôneas desaparecem no estado iluminado da não-dualidade. "
(David Snellgrove, Indo-Tibetan Buddhism)

Ás vezes importa a tristeza e o estado de feto. Será que ao dormir ficamos imunes ao medo? Pode ser que sonhar de olhos abertos seja dormir?Tanto e quanto no mundo importa e hoje só minha cria reluz no céu. Tanto vampiro solto em espaços públicos que sentir-se drenado por sorrisos hipócritas é comum. Que lastima.
Coisas simples da vida interessam: uma cerveja, um bom papo, ler um texto antigo acompanhado de outros ouvidos... Ah! Que prazer, trocar com o próximo amado o que há de mais fundo na janela da alma . Gosto do número dois, entretanto me interessa a solidão que tem o poder de nos aproximar do ínfimo do nosso ser. Longe das orgias é possível se alimentar de palavras, sensações e a firmeza de algum caminho reto. Está certo que luz é clareza. Clareza é saber o que deve- se fazer no próximo momento.Estive pensando sobre o que seria mostrar meu ser. Descobri que não tenho desejo de- monstrar nada. Quero apenas ser eu. Que me veja quem tiver olhos para ver. Sem botox estamos aí. Que veja quem estiver direcionado para o que há de pessoa na imagem.
Imagine a imagem de uma flor no espelho e alguém tentando pegá-la através do reflexo do cristal. Como sentir o cheiro da imagem da flor? Esse alguém não conseguiu alcançar e tocar a flor. Todavia, se esse alguém virasse de costas, teria uma surpresa: a flor estaria ali logo atrás de si mesmo. Só mudando o ponto de vista sentiria o cheiro da flor. A beleza perfumada estava logo ali tão perto e tão fora do campo de visão. A flor é real. A imagem da flor é imaginação. Aqui do lado dos riachos que correm livres entre as pedras vou em busca de olhar as coisas sem que a cor do pigmento dos meus olhos importe tanto.Já não espero telefonemas. Gosto de silêncio ao anoitecer. Palavras, ruidos e gente brotam de todos os lados. Me assusta por dentro o mundo externo. Preciso de paz. Hoje só música clássica.
Rego as palavras com olhos pelos quais vejo o mundo e o mundo me vê. Tem um colorido que me desperta para entender o arco íris de coração.Não farei ao acaso, por acaso, vou saber o por quê de cada ação que sai de minha espinha dorsal. Não é preciso mostrar é necessário ser. Que possamos viver como um ser em constante re-construção. O movimento da mandala poderia ser traduzido como a -vida.